sexta-feira, 15 de maio de 2009

PATERNO AMOR


Na entrada do asilo, um homem robusto, jovem e tranqüilo, apresentava o pai, um velho que contava oitenta e dois janeiros de existência, à funcionária atenta que o ouvia...

Após sentá-lo num pequeno banco, falou à moça em tom seguro e franco:

-“ O velho já não sabe o que pensa ou o que diz, a gritar e a gemer de exigência à exigência, formou de minha casa um recanto infeliz, cujo clima de luta é fogo que me arrasa.

Não quero ver meu filho crescendo com o avô inconveniente, quero-lhe a internação de modo permanente. Quanto custa a pensão?

A moça respondeu indiferente:

-“ A pensão é de quatro mil cruzeiros a serem pagos mensalmente”. O senhor fez o cheque fazendo o pagamento da quantia e depois de informar que voltaria, foi-se ao pai fatigado, explicando ao velhinho:

-“ Meu pai, aqui é a nossa casa de descanso. Terás aqui mais sossego e carinho. Ao voltarmos da Europa virei buscar-te, imediatamente.”

O pranto deslizou sobre a face enrugada e o velho respondeu em voz tremente:

-“ O que será, meu Deus? Que medonho empecilho!... Estar aqui a sós, sem te encontrar, meu filho!... E como agüentarei a falta de meu neto? Não queria afastar-me de meu teto!... Peço por Deus!... Não te demores e vem logo buscar-me...”

O filho replicou, quase ásperamente:

-“ Sem dúvida, meu pai, que podes esperar-me, mas não faças alarme... Nada fará de mim um filho diferente; Creio que ao fim do mês que vem, regressarei como convêm...” Mas o moço partiu e nunca mais voltou ,e ante a expressão do velho, triste e amarga, notava-se que o filho ali se despedira como quem se desliga de uma carga, agindo alegremente.

O velhinho viveu por lá, três anos, de saudade, de dor e desenganos a esperar pelo filho desertor.

A fadiga alterara-lhe a memória, não sabia contar a própria história, declarava-se um rico possuidor de terras e fazendas produtivas, mas entregara tudo ao filho sem amor, numa procuração, sem julga-lo capaz de alguma ingratidão, e embora o filho lhe pagasse o asilo ,sem questionar o preço, não lhe enviava notas de endereço...

Após trinta e seis meses de clausura, o velhinho ralado de amargura,

morreu clamando a falta da família...

O cadáver desceu à vala da indigência, por fim se lhe acabara a penosa existência.

Mas o tempo não para em parte alguma...

Quarenta anos passados, de coração batido e passos retardados, o homem que internara o esquecido velhinho, nota que a morte chega a cercar-lhe o caminho,.

Poderoso senhor, não consegue expressar-se.

Sob qualquer disfarce, tomba, inerte, no leito, e ante o infortúnio da separação, grita por Deus, quer vida e proteção, mas a morte o reclama... o corpo se lhe esfria... Vê-se desencarnado, em noite atroz, terrível e sombria...

Chora quase sem voz, quando sente que alguém lhe toma o cérebro cansado,

e lhe diz brandamente:

-“ Filho do coração, não te aflijas, nem temas, acabaram-se agora os teus problemas; confia em Deus, não percas a esperança, acalma-te e descansa...”

E beijando-lhe os cabelos, dedos mostrando carinhosos zelos, exclamou com ternura:

-“ Agora, sim, achei minha ventura, eu sou teu pai!...

Meu filho, estou aqui... Amo-te agora, mais do que te amava, e só Deus sabe a dor com que eu chorava com saudades de ti!...”


(Francisco Cândido Xavier/Maria Dolores)

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